quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Divergências na Igreja

  • Como agir em tais circunstâncias?
  • Aprova Deus a obra dos dissidentes?

Viver em união, ideal divino para Seu povo. O salmista é claro ao expressar seu desejo: “Como é bom e agradável que o povo de Deus viva unido como se todos fossem irmãos!” Salmo 133:1 (NTLH). Mas assim como os dedos das mãos, embora unidos, são diferentes uns dos outros, numa comunidade qualquer, e o povo de Deus não é exceção, as divergências podem ocorrer. Afinal, as pessoas também têm suas próprias peculiaridades, havendo, obviamente, diferentes opiniões sobre um determinado tema.

Ao considerarmos que os seres humanos diferem dos dedos de nossas mãos pelo fato de terem idéias e vontades próprias, podemos entender que exatamente aí reside o problema, pois em situações nas quais ocorrer as divergências é natural do ser humano não apenas defender seu posicionamento, mas também que o mesmo seja acatado pelos que pensam de maneira diferente. Dependendo da complexidade do tema as divergências podem se tornar um problema de difícil solução, cujas conseqüências acabam por afetar a comunidade à qual pertencem os oponentes.

Diante disso, é necessário e importante que tais diferenças sejam tratadas de forma correta tendo em vista a harmonia do corpo como um todo. Quando tratadas de forma saudável ocorre o fenômeno que se caracteriza pela “unidade na diversidade”.

Por sua vez, Ellen White faz uma abordagem interessante sobre as divergências existentes entre os discípulos de Cristo. Seu comentário contém, em princípio, sábia e segura orientação quanto á forma correta e saudável de se tratar os problemas oriundos das divergências de opiniões. Vejamos:

“Os discípulos oraram com intenso fervor para serem habilitados a se aproximar dos homens, e em seu trato diário, falar palavras que levassem os pecadores a Cristo. Pondo de parte todas as divergências, todo o desejo de supremacia, uniram-se em íntima comunhão cristã. Aproximaram-se mais e mais de Deus, e fazendo isto sentiram que era um privilégio o ser-lhes dado associar-se tão inti-mamente com Cristo. A tristeza lhes inundava o coração ao se lembrarem de quantas vezes O haviam mortificado por terem sido tardos de compreensão, falhos em entender as lições que, para seu bem, estivera buscando ensinar-lhes”. Atos dos Apóstolos, pág. 37. (Grifo nosso).

Sinagoga adventista

Pôr de lado as divergências e unir-se em íntima comunhão cristã. Que desafio! Será isso possível quando as diferenças vão muito além da simples escolha da cor para a pintura da igreja? Nesse caso, quem sabe, após o estudo por uma comissão e a votação em plenário parecem resolver o problema com o voto da maioria. Quando o assunto é mais complexo, a decisão para definir o melhor e o mais acertado procedimento com certeza dependerá de um estudo mais acurado e, obviamente, levará mais tempo. Mas, uma coisa é certa: alguém deverá ceder. Quando isso acontece num espírito de comunhão cristã, à luz das orientações da Palavra de Deus, não haverá mágoas e rancor. Se por acaso isso não ocorrer também é correto afirmar que houve erro no processo e esse erro consiste na ausência do verdadeiro espírito cristão para o tratamento dos problemas entre os filhos de Deus, irmãos em Cristo Jesus.

No presente momento a IASD vem presenciando discussões à semelhança de uma tradicional sinagoga dos tempos de Jesus. A expressão “sinagoga”, embora signifique assembléia de fiéis, também traz consigo a conotação de uma “reunião tumultuosa”, ou seja, aquela que gera discórdia, desarmonia, desavença. Assuntos vários vêm sendo objetos de debates, entre os quais e, especialmente, a questão sobre a natureza do Espírito Santo tem se tornado habitual tanto pela mídia oficial quanto pela paralela.

Todavia, como pode isso estar ocorrendo no seio da igreja que professa ser a detentora da verdade presente? Não deveria haver harmonia e entendimento para que unidos possamos abreviar a volta de Jesus? A Sra. White parece não se preocupar com o fato de haver divergências entre o povo de Deus, desde que as mesmas venham a se constituir num estímulo para um mais cuidadoso estudo das Sagradas Escrituras.

Em nosso próximo tópico, apresentaremos uma interessante citação que nos leva à seguinte questão: Concordância plena em relação às doutrinas é prova de que a Igreja mantém com firmeza a sã doutrina?

Tratamento contraproducente das divergências

Afirmamos também que a Sra. White demonstrava não se preocupar com as divergências entre o povo de Deus. Leia a citação na qual faz algumas colocações importantes:

“O fato de não haver controvérsias ou agitações entre o povo de Deus, não deveria ser olhado como prova conclusiva de que eles estão mantendo com firmeza a sã doutrina. Há razão para temer que não estejam discernindo claramente entre a verdade e o erro. Quando não surgem novas questões em resultado de análise das Escrituras, quando não aparecem divergências de opinião que instiguem os homens a examinar a Bíblia por si mesmos, para se certificarem de que possuem a verdade, haverá muitos agora, como antigamente, que se apegarão às tradições, cultuando nem sabem o quê”. Obreiros Evangélicos, pág. 298. (grifo e negrito acrescentados).

Uma leitura mais detida do capítulo onde se encontra a citação acima com certeza será de grande valia para sabermos o caminho a seguir quando surgem as divergências. Infelizmente, o que se nota, parece não ser a observância dos princípios bíblicos para se tratar com os que estão questionando algumas doutrinas da igreja.

Em tais circunstâncias, os chamados “dissidentes” vêm se sentindo como que pressionados por um compressor centrífugo, aquele que usa o princípio da aceleração de dentro para fora. Dissidente, como sabemos, é aquele que diverge, não aceita, não concorda com as opiniões de outrem ou da opinião geral. Em certo sentido as pessoas dissidentes se encontram em aparente desvantagem, pois caminham em direção contrária à da maioria. Aliás, a História contém inúmeros exemplos de homens e mulheres dissidentes, tal como o clássico exemplo de Galileu. Num momento em que a Igreja Romana usava da força para fazer calar os divergentes de sua doutrina, Galileu ousou polemizar no “perigoso” terreno da Teologia. Enquanto a Igreja negava o movimento da Terra em torno do Sol, Galileu, fundamentado na Ciência passou a divulgar o contrário.

Obviamente, por ir contra o pensamento corrente, sofreu as conseqüências: “Idoso e doente, foi obrigado a viajar a Roma. Ao final dos interrogatórios, foi considerado "veementemente suspeito de heresia". “E, no dia 22 de junho de 1633, vestindo trajes de penitência, de joelhos e com a mão sobre a Bíblia, teve que re-citar, perante o tribunal, a horrível fórmula da abjuração: "Abjuro, maldigo e detesto os citados erros e heresias...". Fonte: www.galileu.globo.com . Sem dúvida, apesar de estar certo em sua tese, faltou-lhe a fé e coragem dos mártires que deram a vida em defesa da verdade.

Embora tardiamente, a Igreja Católica Apostólica Romana admitiu o engano cometido, pois “em 1992, o papa João Paulo II reconheceu formalmente o erro cometido – resultante, segundo ele, de ‘uma trágica e recíproca incompreensão’”. Ibidem.

De volta ao presente, à presente conjuntura da IASD, quem estaria com a razão? A opinião geral, fundamentada no credo da igreja ou os dissidentes que ousam ir contra o posicionamento oficial? Todavia, a questão mais importante não é necessariamente saber quem está com a razão, mas qual o proveito de tão intenso debate. Se tudo contribuir para um mais profundo e sincero conhecimento das Escrituras Sagradas, tudo bem, mas o que se observa, longe de ser uma graciosa e amável troca de idéias, mais parece uma guerra na qual os soldados, entrincheirados, lançam suas granadas uns contra os outros visando a derrota do inimigo.

Com isso prevalece o espírito de desavença, por meio do qual os oponentes se valem de armas como a arrogância, falta de respeito, sarcasmo, provocações, menosprezo, armas estas usadas simultaneamente com textos bíblicos e citações da Mensageira do Senhor. É claro que essa mistura do santo com o profano põe em dúvida os verdadeiros motivos e também o verdadeiro espírito cristão, não importando quem assim se comporte, se um “dissidente” ou um “defensor” da doutrina da igreja. Tais atitudes, além de proporcionarem um mau testemunho da fé em Cristo, provocam o rompimento de boas relações, o que certamente entristece o Pai de amor.

A Mensageira do Senhor adverte: “Há diferenças de opinião em alguns assuntos; é isso, porém, uma razão para sentimentos cruéis e hostis? Inveja, ruins suspeitas e imaginações, desconfianças, ódio e ciúmes hão de entronizar-se no coração? Todas essas coisas são más, completamente más”. Mensagens Escolhidas, vol. 3, pág. 166.

Diante de tão claro posicionamento da Sra. White, será possível encontrarmos um caminho aprovado por Deus quanto ao tratamento das divergências no seio da Igreja?

Tratamento saudável das divergências

Ellen White deplora os vis sentimentos que podem ser alimentados no coração por causa de um tratamento desajustado ao plano de Deus para as diferenças de opinião. Para tanto volto a fazer uso de uma citação da serva do Senhor:

“O fato de não haver controvérsias ou agitações entre o povo de Deus, não deveria ser olhado como prova conclusiva de que eles estão mantendo com firmeza a sã doutrina. Há razão para temer que não estejam discernindo claramente entre a verdade e o erro. Quando não surgem novas questões em resultado de análise das Escrituras, quando não aparecem divergências de opinião que instiguem os homens a examinar a Bíblia por si mesmos, para se certificarem de que possuem a verdade, haverá muitos agora, como antigamente, que se apegarão às tradições, cultuando nem sabem o quê”. Obreiros Evangélicos, pág. 298. (grifo e negrito acrescentados).

Pois bem, o foco principal destas considerações se volta para a necessidade de se tratar do assunto de forma saudável, seguindo conselhos e orientações da inspiração. Seria isso apenas o sonho de um projeto irrealizável?

Novamente de volta ao passado, mais precisamente em 1888, em Mineápolis, durante a Assembléia da Conferência Geral, quando ocorreram acirrados debates doutrinários, a Sra. White por várias vezes ocupou o púlpito para apresentar mensagens matinais. Em sua advertência, apresentada em parágrafo anterior, ela enfatiza:

“Nosso auxílio só está em Deus. Passemos muito tempo em oração e examinando o coração com o devido espírito - ansiosos de aprender e dispostos a ser corrigidos ou esclarecidos nalgum ponto em que talvez estejamos errados. Se Jesus estiver em nosso meio e se nosso coração for enternecido por Seu amor, teremos uma das melhores assembléias a que já assistimos”. Ibidem. (Grifo nosso).

Por sua vez, a oração de Jesus expressa em João 17:20 a 23 aponta para o encontro e a unidade. As palavras do Exemplo de mansidão e humildade são válidas na presente consideração:

“Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra; a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o somos; eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim”.

Comentando a oração de Cristo, Ellen White assim se expressou:

“É vontade de Deus que a união e o amor fraternal existam entre Seu povo. A oração de Cristo, precisamente antes de Sua crucifixão, foi para que Seus discípulos fossem um como Ele é um com o Pai, a fim de que o mundo pudesse crer que Deus O enviara. Essa oração mui tocante e maravilhosa atravessa os séculos, até mesmo aos nossos dias; pois Suas palavras foram: ‘Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que pela sua palavra hão de crer em Mim.’ João 17:20. Conquanto não devamos sacrificar um único princípio da verdade, deve ser nosso constante objetivo atingir este estado de unidade. Esta é a prova de nosso discipulado. Disse Jesus: ‘Nisto todos conhecerão que sois Meus discípulos, se vos amardes uns aos outros’”.João 13:35. Patriarcas e Profetas, pág. 520.

União e amor fraternal. Essa é a vontade de Deus, mas qual a atitude que impera na atual conjuntura de nossa igreja? Comentando e advertindo a igreja de Batlle Creek, a Mensageira do Senhor proferiu palavras que poderiam ser úteis à igreja hoje:

“Na igreja de Battle Creek penetrou um espírito que não tem parte em Cristo. Não é o zelo pela verdade, nem o amor pela vontade de Deus como revelada em Sua Palavra. É um espírito de justiça própria. Ele vos leva a exaltar o eu acima de Jesus e a considerar vossas próprias opiniões e idéias como mais importantes do que a união com Cristo e de uns com os outros. Sois tristemente carentes em amor fraternal. Sois uma igreja apostatada. Conhecer a verdade, professar união com Cristo, e todavia não produzir fruto, não viver no exercício de constante fé - isto endurece o coração na desobediência e na confiança própria. Nosso crescimento na graça, nossa felicidade, nossa utilidade, tudo depende de nossa união com Cristo e o grau de fé que nEle exercemos. Aqui está a fonte de nosso poder no mundo”. Conselhos sobre Educação, pág. 78 (Grifo nosso).

Relembrar a experiência dos cristãos da era apostólica faria bem a todos. A Sra. White faz a seguinte declaração:

“Cada cristão via em seu irmão uma revelação do amor e benevolência divinos. Só um interesse prevalecia; um elemento de emulação absorveu todos os outros. A ambição dos crentes era revelar a semelhança do caráter de Cristo, bem como trabalhar pelo desenvolvimento de Seu reino”. Atos dos Apóstolos, pág. 48.

No entanto, com o passar do tempo e à medida que os seguidores de Cristo se tornavam numerosos os problemas começaram a espocar em vários lugares. A Mensageira do Senhor afirma:

“Os tempos eram cheios de perigo para a igreja. Enganos satânicos existiam por toda parte. Por meio de adulteração e falsificação os emissários de Satanás buscavam suscitar oposição às doutrinas de Cristo; e como conseqüência disso, dissensões e heresias estavam pondo em perigo a igreja”. Ibidem, pág. 553.

As palavras acima se encontram num capítulo no qual o personagem central é o apóstolo João e ao final do mesmo a Sra. White afirma que, “como testemunha de Cristo, João não se empenhou em controvérsia ou em fastidiosos debates”.

Não seria maravilhosa uma tal atitude no presente momento? Embora saiba das dificuldades para que isso venha acontecer, estou dedicando tempo e energia para semear a semente do entendimento. Não custa tentar, não é mesmo? Na próximo tópico tentaremos responder à pergunta: “Será possível uma trégua nessa “Guerra Santa?”.

Será possível uma trégua nessa “Guerra Santa”?

A pergunta levanta uma questão muito complicada, pois existem fatores os mais diversos que envolvem essa possibilidade.

A verdade, porém, é que tal desejo não passa de um doce e acariciado devaneio da parte de muitos dos fiéis. Os debates e as controvérsias são um fato real em nossa igreja e clamam por um consenso que não acontecerá enquanto os “soldados” não saírem de suas trincheiras e caminharem ao encontro para o diálogo cristão em busca de uma solução para o impasse. Afinal, todos que estão empenhados em tais debates crêem ser filhos de Deus, pertencem ao mesmo exército e presumem estar em defesa da Verdade, pois ao tecer comentários e escrever artigos o fazem lançando mão das Escrituras Sagradas e os escritos de Ellen G. White. Qual seria então o obstáculo que estaria impedindo o relacionamento saudável entre as partes?

Acordo, entendimento e ajuste serão muito difíceis enquanto os que afirmam estar em defesa da Verdade (e isto vale para ambas as partes) ficarem a trocar acusações tais como: “Esses dissidentes, por acharem que têm nova luz, estão perturbando o arraial dos fiéis”, ou “A liderança está a caminho da apostasia, pois o abandono dos marcos fundamentais de nossa fé está se tornando cada vez mais uma triste realidade”. (Obs.: As “acusações” acima citadas como exemplo não correspondem a nenhuma afirmação textual de um ou outro autor, mas sim, o sentido geral que se pode perceber no contexto de suas falas ou escritos).

Sendo o foco destas considerações o tratamento que se deve dar aos dissidentes, seria interessante, em tais circunstâncias, evocar exemplos da Palavra de Deus a fim de evitar julgamentos e ações precipitadas em relação a tais pessoas. Em tais exemplos encontraremos situações nas quais a liderança se encontrava em erro e os chamados “perturbadores” estavam certos. Nos escritos da Mensageira do Senhor encontramos comentários interessantes dos quais citamos dois que se relacionam com as situações acima aludidas:

1. “Príncipes em Israel estavam-se mostrando infiéis ao seu mister; falsos profetas se levantavam com mensagens que levavam ao extravio, e até alguns dos sacerdotes estavam ensinando por interesse. Não obstante os líderes em apostasia ainda conservavam as formas do culto divino, e presumiam ser contados entre o povo de Deus”. Profetas e Reis, pág. 322.

2. “Ainda que Jesus fosse inocente, insistia o sumo sacerdote, devia ser afastado do caminho. Ele era perturbador, arrastando o povo após Si e diminuindo a autoridade dos principais. Era apenas um; melhor seria morrer Ele que se enfraquecer a autoridade dos príncipes. Se o povo perdesse a confiança em seus chefes, estaria destruído o poder nacional”. O Desejado de Todas as Nações, pág. 540.

Tais palavras nos advertem quanto ao juízo apressado que podemos estar emitindo sobre esta ou aquela pessoa. Provérbios dezesseis, verso dois, na versão parafraseada da Bíblia Viva afirma que “nós sempre podemos provar que nossos atos estão certos, mas o Senhor sabe muito bem quais foram nossas intenções”.

Também a Sra. White vai fundo ao abordar essa questão:

“Muitos recebem aplausos por virtudes que não possuem. O Perscrutador dos corações pesa os motivos, e muitas vezes ações altamente louvadas por homens são por Ele registradas como par-tindo de egoísmo e baixa hipocrisia. Cada ato de nossa vida, seja excelente e digno de louvor ou merecedor de censura, é julgado pelo Perscrutador dos corações segundo os motivos que o determinaram”. Obreiros Evangélicos, pág. 275.

Diante de tais possibilidades por que não adotar o espírito reinante entre os nossos pioneiros? No livro acima citado, à página 302, a Sra. White nos apresenta um oportuno testemunho:

“Em 1844, quando se apresentava à nossa atenção qualquer coisa que não compreendíamos, ajoelhávamo-nos e pedíamos a Deus que nos ajudasse a assumir a devida atitude: e depois éramos habilitados a chegar à justa compreensão, e a ter todos a mesma opinião. Não houve dissensão, nem inimizade, nem ruins suspeitas, nem mau juízo contra os irmãos. Se tão somente soubéssemos o mal do espírito de intolerância, quão cuidadosamente dele haveríamos de fugir!”

“Temos de estar firmados na fé segundo a luz da verdade que nos foi dada em nossa primeira experiência. Naquele tempo, erro após erro procurava forçar entrada entre nós; ministros e doutores introduziam novas doutrinas. Nós estudávamos as Escrituras com muita oração, e o Espírito Santo nos trazia ao espírito a verdade. Por vezes noites inteiras eram consagradas à pesquisa das Escritu-ras, a pedir fervorosamente a Deus Sua guia”. (Grifo nosso).

Pelos exemplos acima citados, podemos supor que existe sim a possibilidade de uma trégua nessa “Guerra Santa”, desde que a “Situação” e a “Oposição”, se disponham a reconhecer a necessidade da mesma para um tratamento saudável das divergências. No entanto como será isso possível numa igreja globalizada?

Quem deve dar o primeiro passo?

Será possível um armistício? Uma trégua para que, como irmãos em Cristo, possa haver um tratamento saudável das divergências que estão causando rachaduras na estrutura da Igreja? Se sim, e esta é a esperança de muitos cristãos desejosos de ver a paz em Israel, surge uma outra pergunta:

Quem, porém, deveria tomar a iniciativa para a efetivação de um concílio onde, ao invés de discutir planos e programas, o principal objetivo deveria ser o estudo da Bíblia com oração e jejum? Queiramos ou não, este é o caminho segundo afirma a Sra. White:

“O estudo da Bíblia é digno do melhor esforço mental, da mais santificada capacidade. Quando nova luz for apresentada à igreja, ser-vos-á perigoso rejeitá-la. Recusar ouvir a mensagem, por ter preconceito contra ela ou contra o mensageiro, não desculpará vos-so caso perante Deus. Condenar aquilo que não ouvistes ou não compreendestes, não vos exaltará aos olhos dos que são sinceros em suas buscas da verdade”. Conselhos sobre a Escola Sabatina, pág. 32.

“É vontade de Deus que todos os fundamentos e posições da verdade, sejam cuidadosa e perseverantemente estudados, com oração e jejum. Os crentes não devem ficar em suposições e mal definidas idéias do que constitui a verdade. Sua fé deve estar firmemente estabelecida sobre a Palavra de Deus,...”. Obreiros Evangélicos, pág. 299. (Grifo nosso).

Entretanto, a igreja hoje já não é mais um pequeno grupo de pessoas. Ela se avolumou de tal forma que se encontra espalhada por todo o mundo e, em tal conjuntura, os dissidentes também se encontram espalhados. Sendo assim, como promover uma reunião à semelhança de nossos pioneiros? Como reunir tais pessoas a fim de estudar os assuntos que estão proporcionando tão acalorados debates através da mídia?

Dadas as dificuldades de tempo, disponibilidade, distância e recursos financeiros, é realmente complicado reunir os expoentes desta ou aquela posição em relação às doutrinas da Igreja. Mas, imaginando a solução de tais empecilhos, restaria ainda, quem sabe, um obstáculo de muito maior gravidade, o sentimento de dignidade pessoal dos defensores. Afinal, quando se tem certeza da razão, por que dedicar tempo e energia em busca de consenso? Arrisco, porém mais uma suposição: Será que temos tão pouca confiança em nosso posicionamento doutrinário que não estejamos dispostos a conversar com alguém que com tais doutrinas não concordam?

E o problema, em tais circunstâncias, tende não apenas a continuar, mas a agravar-se. Então parece, diante do estado de ânimo de ambas as partes, que só a intervenção divina poderá exercer influência na consciência das pessoas, tanto dos que estão envolvidos nas discussões, quanto nas que se encontram nas “arquibancadas” assistindo esse embate teológico.

Acredito que o livro de Atos, no capítulo cinco, versos 24 a 42 contém um relato não apenas importante, mas oportuno. Trata-se do episódio em que Pedro e João, após miraculoso livramento da prisão, foram levados pela segunda vez ao sinédrio a fim de serem julgados pelos furiosos líderes judaicos. A Sra. White relata vividamente a cena ocorrida no tribunal dos judeus:

“Tão enraivecidos ficaram os judeus com estas palavras que se decidiram a fazer justiça pelas próprias mãos, e, sem mais processo, ou sem autoridade dos oficiais romanos, matar os presos. Já culpados do sangue de Cristo, estavam agora ávidos de manchar as mãos com o sangue de Seus discípulos.

“Mas no concílio houve um homem que reconheceu a voz de Deus nas palavras proferidas pelos discípulos. Este homem foi Gamaliel, fariseu de boa reputação e homem de saber e alta posição. Seu claro intelecto viu que o passo violento que tinham em vista os sacerdotes, traria terríveis conseqüências. Antes de se dirigir aos presentes, pediu que os presos fossem afastados. Bem conhecia os elementos com quem tinha de tratar; sabia que os assassinos de Cristo em nada hesitariam a fim de levar a efeito o seu propósito.

“Falou então com grande ponderação e calma, dizendo: ‘Varões israelitas, acautelai-vos a respeito do que haveis de fazer a es-tes homens. Porque antes destes dias levantou-se Teudas, dizendo ser alguém: a este se ajuntou o número de uns quatrocentos homens; o qual foi morto, e todos os que lhe deram ouvidos foram dispersos e reduzidos a nada. Depois deste levantou-se Judas, o galileu, nos dias do alistamento, e levou muito povo após si; mas também este pereceu, e todos os que lhe deram ouvidos foram dispersos. E agora digo-vos: dai de mão a estes homens, e deixai-os, porque, se este conselho ou esta obra é de homens, se desfará. Mas, se é de Deus, não podereis desfazê-la; para que não aconteça serdes também achados combatendo contra Deus’." Atos 5:35-39. Atos dos Apóstolos, pág. 82 e 83.

Para nós hoje, ao lermos o relato acima, é deveras cômodo tomarmos o partido dos apóstolos e nos inflarmos de ânimo contra os enraivecidos líderes judaicos. No entanto, para sermos corretos precisamos nos lembrar que os sacerdotes, julgando, presumindo ser os guias religiosos do povo de Deus, se encontravam preocupados com a divulgação dos novos conceitos que ameaçavam a estrutura das crenças judaicas. Por isso mesmo em seu zelo cego não mediam esforços para deter a acelerada marcha do cristianismo.

Embora vivamos em tempos mais civilizados e a ocorrência dos acontecimentos que estamos presenciando no seio de nossa igreja não se apresente assim com intenções tão perigosas, entendo que a recomendação de Gamaliel seja não apenas apropriada, mas acima de tudo carregadas de prudência e bom senso. Acima de tudo, por nos desafiar a fé na direção divina quanto ao andamento de Sua Obra na face da Terra.

“E agora digo-vos: dai de mão a estes homens, e deixai-os, porque, se este conselho ou esta obra é de homens, se desfará. Mas, se é de Deus, não podereis desfazê-la; para que não aconteça serdes também achados combatendo contra Deus”.

Um abraço! Que Deus esteja sempre ao nosso lado.